segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Função Social e Ambiental da Propriedade

Convido-os a discutir um tema dos mais relevantes ao meio ambiente urbano e que, sem dúvida, deverá constar da plataforma política dos futuros candidatos ao pleito a prefeito que se avizinha.
Preliminarmente, é preciso que tenhamos a compreensão que o conceito de propriedade não deve mais ser aquele reinante no século XIX, onde a mesma era absoluta, inviolável e sagrada. Seu conteúdo era exclusivamente individual, desprezando os efeitos que a mesma poderia causar aos demais habitantes de uma dada sociedade.
Atualmente, o direito à propriedade, após ter sofrido o impacto das transformações históricas, detém um novo significado que ultrapassa a análise do direito individual e leva em consideração o aspecto coletivo da sociedade.
Em termos de regramento constitucional, o direito à propriedade veio a sofrer uma flexibilização, deixando de ser considerado absoluto, com o advento da Constituição Federal de 1934 que dispunha que tal direito não poderia ser exercido contra o interesse coletivo.
Após uma longa evolução, o direito à propriedade permaneceu sendo consagrado no texto constitucional de 1988, porém com uma importante e decisiva vinculação ao atendimento da função social.
Para muitos leitores deste artigo a mencionada função social é matéria restrita ao mundo acadêmico. No entanto, àqueles que assim pensam, peço que revejam seus conceitos, afinal, as conseqüências de um mau uso da propriedade urbana poderão ser sérias, com efeitos negativos à coletividade residente nos centros urbanos.
Preciso dizer que o art. 30, VIII da Constituição de 1988 delega aos Municípios a competência de promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.
Além da regra constitucional em menção, lembro que sobre o tema ainda há o regramento constante no Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) e nos Planos Diretores Urbanos.
Denota-se, portanto, a enorme responsabilidade que os gestores e legisladores municipais têm em suas mãos no sentido de ordenar o espaço territorial urbano.
É uma pena que na realidade das cidades esteja expresso um total descompromisso dos seus gestores para com o ordenamento e ocupação do solo urbano, comprometendo, sobremaneira, o meio ambiente urbano e, por conseguinte, a qualidade de vida daqueles que habitam nas cidades. Vislumbra-se, portanto, que além do aspecto social, a doutrina agregou um novo elemento à referida função, neste caso, a vinculação ao meio ambiente.
Assim, o desejo do constituinte de que a função social e ambiental da propriedade fosse cumprida, em grande medida, não deixa de ser mais um amontoado de letras sem qualquer efetividade, infelizmente.
Ao olhar pelas janelas do meu apartamento, facilmente constato que são inúmeras as propriedades que não cumprem com a citada função, pelo fato de há anos estarem sem qualquer edificação, subutilizadas ou não utilizadas. Em verdade, são instrumentos de mera especulação imobiliária, desprovidas de qualquer utilidade à coletividade. Afinal, é bom lembrar que o interesse coletivo deve prevalecer diante do individual.
Entretanto, penso que esta realidade precisa ser alterada, ou seja, o poder público municipal precisa cumprir com o seu papel e, de fato, promover o ordenamento e a ocupação territorial de modo a fazer com que a função social e ambiental da propriedade urbana seja atendida.
Interessante dizer que são vários os instrumentos que estão à disposição das municipalidades e podem tornar efetivo o cumprimento da citada função, dentre os quais estão o parcelamento compulsório, o IPTU progressivo no tempo, o IPTU com alíquotas diferenciadas em razão da localização e do uso do imóvel e, também, a desapropriação com pagamentos da dívida pública.
Sem maiores aprofundamentos, ressalto que os Executivos e Legislativos municipais podem (devem) criar de uma legislação tributária municipal com contorno ambiental, denominada pela doutrina jurídica de tributação ambiental que utiliza os tributos de competência municipal com fins extrafiscais, cujos exemplos pelo país abundam, notadamente, por meio da utilização do IPTU ambiental.
Os Municípios podem carecer de recursos, porém possuem instrumentos jurídicos eficazes que não são utilizados devido à falta consciência ambiental e vontade política para fazer valer o que a Carta Magna dispõe.

BRUNO SOEIRO VIEIRA
é Auditor Fiscal, Especialista em Direito Tributário, Mestre em Direito e Professor.

* Artigo publicado no jornal Diário do Pará no dia 07/11/2010.

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