Celso Furtado foi um dos mais importantes e influentes intelectuais da nossa história. Autor de dezenas de livros, ensaios e teses, contribuiu de forma decisiva para a interpretação das barreiras ao desenvolvimento no Brasil e na América Latina. Adepto do intervencionismo keynesiano, uma de suas obras, Formação Econômica do Brasil, é considerada até os dias de hoje peça-chave para a análise socio-econômica brasileira.
Celso Furtado se destacou como um dos primeiros autores no pós-guerra a tratar a realidade latino-americana a partir de suas especifi dades sociais e econômicas. Ele enxergava o fenômeno do subdesenvolvimento não como uma etapa inevitável para a constituição das economias capitalistas, mas como um processo histórico autônomo, espécie de deformação dessa dinâmica. Tratava-se de uma nova abordagem do sistema centro-periferia, que propunha saídas em busca de um outro patamar de distribuição de renda e justiça social.
Em suas obras nos anos 1950, ele expunha que os países da América Latina encararam um processo de industrialização indireto, herança do passado colonial e da industrialização já avançada das nações europeias e dos Estados Unidos. Isso levou a uma baixa diversificação produtiva, que, acentuada pela grande oferta de mão-de-obra, não seria alterada caso a região ficasse à mercê das leis de mercado. Caberia, então, ao Estado conduzir um planejamento que permitisse a transição da economia agroexportadora para a industrial.
O atual ministro da Fazenda, Guido Mantega, descreveu a obra de Furtado como a 'passagem do pensamento econômico brasileiro da pré-história para a história'. "Anteriormente, já haviam sido produzidos trabalhos importantes, nessa área de conhecimento (...), mas nenhum deles conseguiu definir um método analítico e amarrar com tanta pertinência os determinantes da dinâmica econômica brasileira".
História - Nascido em 1920, em Pombal, Paraíba, Celso Furtado graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1944. Nesse mesmo ano, integrou a Força Expedicionária Brasileira (FEB), em missão na Itália. Dois anos depois, iniciou doutorado em Economia na Universidade de Paris, França. Sua tese foi sobre a economia brasileira no período colonial.
De volta ao Brasil, retoma os trabalhos no Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) e junta-se ao quadro de economistas da Fundação Getulio Vargas (FGV). Em 1949, passa a viver em Santiago, Chile, integrando a recém-criada Comissão Econômica para a América Latina (Cepal). Pouco depois, seria nomeado diretor da Divisão de Desenvolvimento do órgão, e cumpriria missões em vários países como Argentina, Equador, Peru, Venezuela e México.
Na década de 1950, Celso Furtado daria início aos ensaios e artigos sobre análises econômicas. Formação de Capital e Desenvolvimento Econômico seria o primeiro de circulação internacional, traduzido pela Associação Internacional de Economia. Em 1953, ele viria a presidir o grupo, formado pela Cepal e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE), que tinha o objetivo de elaborar estudo sobre a economia brasileira. O relatório final do trabalho, editado em 1955, teve grande importância no governo de Juscelino Kubitschek: foi a base para o Plano de Metas, que impulsionaria o desenvolvimento do país nos anos seguintes.
Em 1959, ele trabalha no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e elabora para o governo federal o estudo Uma Política de Desenvolvimento para o Nordeste, que daria origem à Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Nesse mesmo ano, Furtado lança aquela que é considerada sua obra mais preciosa e influente: Formação Econômica do Brasil. Ela descreve a evolução da economia do país por meio da estrutura de produção de cada período da nossa história, se detendo no raciocínio sobre as medidas que deveriam ser tomadas para que o Brasil consolidasse uma economia capitalista industrial.
Curiosamente, o livro não foi escrito no país. Furtado pediu licença da Cepal e foi para Cambridge, na Inglaterra, aprofundar seus conhecimentos sobre autores e teorias da comunidade acadêmica europeia. "Formação Econômica do Brasil é tido como o primeiro livro de economia escrito no país. Traz um método de investigação original, que permitiu entender o Brasil inserido nas economias desenvolvidas e abriu caminho para discussões que tinham como grande objetivo a distribuição de renda dentro do país", afirma Mauro Boianovsky, professor titular do departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB).
A contribuição de Celso Furtado também foi destacada nos governos de Jânio Quadros e João Goulart, de quem foi ministro do Planejamento. Após o golpe militar de 1964, exilou-se no Chile e, mais tarde, nos Estados Unidos e na França. Ingressou nos quadros da Universidade de Paris, onde ficou por 20 anos. Na década de 70, viajou pelo mundo como professor das Nações Unidas. Retornou ao Brasil em 1979 e, dois anos depois, filiou-se ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Em 1985, foi nomeado embaixador do Brasil junto à Comunidade Econômica Europeia, e se muda para Bruxelas, Bélgica.
Celso Furtado foi ministro da Cultura do governo José Sarney, de 1986 a 1988, e um dos responsáveis pela primeira lei de incentivos fiscais à cultura. Paralelamente, a vida acadêmica continuava, com participação em encontros e comissões internacionais. Entre 1993 e 1995, foi um dos 12 membros da Comissão Mundial para a Cultura e o Desenvolvimento, da ONU/Unesco. Dois anos mais tarde, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Em 2003, foi indicado ao Prêmio Nobel de Economia. Faleceu em 2004, no Rio de Janeiro.
Fonte: Revista mensal de informações e debates do IPEA (Agosto)
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